Jacques Pilon: Conheça a histórias e as principais obras do arquiteto modernista
Ao andar pelas ruas do Centro de São Paulo é inevitável não cruzar com algum edifício projetado por Jacques Pilon. Entre as décadas de 1930 e 1960, o francês fez parte de um seleto e talentoso grupo de arquitetos que ajudaram a construir a história da cidade através de suas obras.
No começo dos anos 1930, a metrópole, principalmente a zona central, tinha como objetivo se firmar no mercado financeiro e empresarial do país. Jacques Pilon entra como nome essencial para esse momento ao projetar, junto de outros profissionais, edifícios verticais – escritórios e residências – que simbolizavam uma mudança comportamental e cosmopolita inspirada em cidades como Nova Iorque e capitais europeias.
Nascido em Le Havre (França), em 1905, Jacques Pilon veio com a família para o Rio de Janeiro em 1910. Em 1927 retorna à França para completar os estudos em Direito e Arquitetura e, em 1933, fixa residência no Rio trabalhando no escritório de Robert Prentice, renomado arquiteto escocês.
Em 1934 se mudou para São Paulo, se associou inicialmente ao engenheiro Francisco Matarazzo Neto, com quem fundou a PilmatPilon-Matarazzo Ltda – conhecida como PILMAT. A partir daí, nessa sociedade ou em outras empresas fez cerca de 60 obras que mudaram de forma definitiva a cara da região central. Foi um dos responsáveis por redesenhar São Paulo em uma época de urgência por urbanização, modernização e crescimento econômico.
Além de trabalhar, Jacques Pilon também morou no Centro. Em 1934, projetou o Edifício São Luís (imóvel residencial encomendado a pedido de sua clientela), na esquina da Praça da República com a Avenida Ipiranga, onde morou até o seu falecimento, em 1962.
Um de seus edifícios comerciais, o Irradiação, na esquina da Avenida Senador Queiroz com Rua Brigadeiro Tobias, está sendo reformado pela TPA Empreendimentos, no conceito de retroart, e será transformado num edifício residencial com serviços. Rebatizado de Jacques Pilon Residence, o edifício, além de residências, terá estabelecimentos comerciais no térreo e um terraço que promete se transformar no novo ponto de referência da região.
Memórias afetivas
A figura e a obra de Pilon no Brasil permanecem vivas, não só por estarem espalhadas pelas ruas do Centro, mas também por conta de alguém que guarda memórias especiais do arquiteto. Carla Pilon, sua neta mais velha, fala com carinho sobre os seis anos em que conviveu com o avô.
“Lembro das minhas tardes no apartamento do Edifício São Luiz com ele sempre acompanhado de seus charutos e cigarros. Era um homem muito sofisticado, charmoso e com uma vida social intensa”, conta ela. “Tínhamos uma chácara em Santo Amaro, em frente à Represa Billings, com jardins de Burle Marx, era uma casa linda e um cartão-postal para receber os amigos estrangeiros”.
Carla conta que o interesse pelas obras do avô nunca deixou de existir, porque o tempo todo pessoas pedem declarações sobre Pilon para estudos e publicações. “Eu sempre fui fã número um do trabalho dele, cresci com todas essas histórias ao meu redor, até porque morei em casas que ele construiu. Tenho o maior prazer do mundo em levar sua obra para as pessoas e carrego meu sobrenome com muito orgulho, afinal ele faz parte da construção da cidade. Fico emocionada quando alguém me conta que mora em um dos prédios que ele projetou”.
A psicóloga define o legado arquitetônico do avô como algo que transformou a cara da cidade: “São Paulo tinha um ar bem provinciano e Pilon conseguiu enxergar a oportunidade de construir um lugar moderno que já existia nas grandes cidades europeias”.
Importância para a arquitetura de São Paulo
Em seu livro “São Paulo na Alturas – A Revolução Modernista da Arquitetura e do Mercado Imobiliário Nos Anos 1950 e 1960”, o jornalista Raul Juste Lores conta que a moradia vertical demorou a deslanchar na capital: “Em 1939, havia apenas 813 prédios com elevador na cidade, e dois terços deles eram ocupados por escritórios. Em 1945, menos de 1% da população paulistana vivia em apartamentos e quem morava no Edifício Columbus – projetado por Rino Levi e inaugurado em 1932 – colocava cortinas pesadas e escuras nas janelas com medo de ter sua privacidade devassada”. Isso acontecia porque as pessoas não estavam acostumadas a viver em residências verticais e a dividir o mesmo terreno.
Seguindo o modelo de negócio em Nova Iorque, surgiram alguns prédios de luxo na cidade, como o Edifício Esther e o São Luiz, este último um dos importantes projetos de Pilon. Ambas as obras, na Praça da República, tinham apartamentos com identidade mais próxima de residências.
Em contraponto a projetos de edifícios luxuosos, Pilon e o parceiro Franz Heep passam a planejar prédios com apartamentos menores, mais tarde apelidados de “quitinetes”. É o que conta Joana Mello – professora de História e Arquitetura – no livro “O Arquiteto e a Produção da Cidade – A Experiência de Jacques Pilon, 1930-1960: “Se para as camadas de maior poder aquisitivo a área não configura como fator decisivo de compra, para as classes médias ela é essencial, já que há menor capacidade de pagamento e o desejo de permanecer e usufruir da estrutura das áreas centrais da cidade”.
Trajetória profissional
A trajetória profissional de Pilon começa de fato quando, em 1934, é chamado para ir a São Paulo para acompanhar as obras do Edifício SULACAP, onde conhece o engenheiro Francisco Matarazzo Neto. No mesmo ano, os dois fundam em São Paulo a PilmatPilon-Matarazzo Ltda – conhecida como PILMAT – situada na Rua Barão de Itapetininga, na República. Entre outros projetos, participam do concurso para projetar o novo Viaduto do Chá. Ficam em 3º lugar e quem assume é o francês Jules Martins. Em 1939, vencem o concurso para projetar o Viaduto General Olímpio da Silveira.
De 1935 a 1939, A PILMAT realizou inúmeros projetos de extrema importância para a modernização da região central, como o Edifício Santo André, encomenda feita pelo pai de Francisco, Andrea Matarazzo. O prédio fica no bairro Higienópolis com vista para o Parque Buenos Aires. Entre os moradores ilustres estava a artista modernista Tarsila do Amaral.
Entre 1936 a 1942,em parceria com o escritor Rubens Borba de Moraes, a PILMAT é convidada para desenvolver o projeto da Biblioteca Mário de Andrade, que precisa ser transferida da Rua Sete de Abril para o atual endereço: Rua da Consolação, 94, no centro da Praça Dom José Gaspar. A inauguração acontece em janeiro de 1942, quando a sociedade entre Pilon e Matarazzo já havia sido desfeita.
Em 1940, Pilon abre um escritório que agrega grandes nomes do ramo, como Franz Heep e Herbert Duschenes (ambos da Alemanha), Jerônimo Bonilha Esteves (Brasil)e Giancarlo Gasperini (Itália), que passam a assumir os projetos de arquitetura na cidade. Com o falecimento de Pilon, em 1962, o escritório é fechado.
Em 1951, volta ao Rio de Janeiro para projetar, em coautoria com Auguste Rendu, o Edifício Maison de France, que abriga o Consulado Geral da França no Rio. A obra é um grande marco na história da arquitetura moderna carioca.
Entre 1951 e 1957 é construído, também no Rio, o Edifício Chopin. Pilon inovou ao incluir janelas de vidro em toda a extensão do prédio, algo inédito na arquitetura de Copacabana.
Principais projetos no Centro:
Biblioteca Mário de Andrade: Rua da Consolação, nº 94 – República
O edifício que abriga a biblioteca é um dos marcos da arquitetura em São Paulo. Em parceria, Pilon e Matarazzo desenvolveram o projeto inspirado no estilo art déco. Durante o projeto previa-se a construção de duas torres de 22 andares cada, mas apenas uma foi construída.
Edifício Acádia (Sede da Academia Paulista de Letras): Largo do Arouche, nº 324, República
Fundada em 1955 e localizada no Largo do Arouche, a sede e foi construída em estilo art déco já com transição para a arte modernista. O edifício de 16 andares foi tombado em março de 2010, passou por uma reforma na estrutura e as obras foram concluídas em outubro de 2017.
Na Rua Marconi, Pilon projetou quatro prédios: Edifício Francisco Coutinho (nº 31),Edifício Ernesto Ramos(nº 53), Edifício Anhumas (nº 107), endereço de seu escritório em 1939, e o Edifício São Manoel(nº 138).
Edifício Barão de Iguape: Rua São Bento, nº 125 – Centro
Com vista para o Viaduto do Chá, a imponente construção tem 133 metros de altura e trinta andares. Em parceria com Giancarlo Gasperini, Pilon foi inspirado por torres executadas nos Estados Unidos.
Edifício Canadá: Rua Quinze de Novembro, nº212 – Centro
Foi um dos primeiros projetos de Pilon após desfazer sociedade com Matarazzo, por isso, dos três edifícios construídos dois são de Pilon e um assinado por Matarazzo. A proposta inicial de Pilon era trabalhar em um terreno maior e ainda criar uma passagem para a Rua Boa Vista, mas a ideia não foi adiante.
Edifício Irradiação (Hoje Jacques PilonResidence) – Avenida Senador Queirós, 101 – Centro
Projetado na década de 1940, o edifício foi revitalizado e será transformado em imóvel residencial. Com 161 apartamentos, que vão de 19 a 41m², a obra é uma importante contribuição para a revitalização da região central e sua inauguração está prevista para abril de 2019.
Edifício Santo André – Rua Piauí,nº 752 – Higienópolis
Segundo projeto em Higienópolis da sociedade PILMAT, o edifício foi uma encomenda do pai de Francisco, Andrea Matarazzo, com objetivo exclusivamente residencial.
Edifício São Luiz – Praça da República, nº 77 – República
Projeto de 1944 feito em estilo neoclássico francês, a construção tem 22 apartamentos que vão de 145 a 245 m² e todos com banheiros de mármore italiano e lareira. João Goulart e o próprio Pilon foram moradores do prédio.
Edifício Paissandu – Largo do Paissandu, nº 100 – República
Concluído em 1938 e projetado pela PILMAT, o prédio residencial faz parte da transição da arquitetura art déco para o modernismo.
Edifício Pauliceia e São Carlos do Pinhal – Av. Paulista – nº 960 / Rua São Carlos do Pinhal, nº 345
Em 1956, Pilon e Gian Carlo Gasperini lançaram o Pauliceia/São Carlos do Pinhal, para a Sul-América Capitalização, com duas grandes torres: uma de frente para a Paulista, outra para a paralela Rua São Carlos do Pinhal, ambas cercadas por jardins desenhados por Burle Marx. O projeto consolida a tendência de abrigar unidades de vários tamanhos, de um a três quartos, num mesmo edifício.